Amaioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) já votou para suspender todo e qualquer ato do Ministério da Justiça de produção ou compartilhamento de informações sobre cidadãos “antifascistas”. Pelo entendimento dos ministros, a pasta comandada pelo ministro André Mendonça fica proibida de levantar dados sobre a vida pessoal, escolhas pessoais ou políticas e práticas cívicas exercidas por opositores ao governo.
Na última quarta-feira, 19, a relatora do caso, ministra Cármen Lúcia, votou contra o monitoramento de opositores do governo. Com duros recados ao Planalto, a ministra disse que o Estado “não pode ser infrator”, ressaltou que “não compete a ninguém fazer dossiê contra quem quer seja” e elogiou a imprensa, que revelou a existência do relatório.
Até a publicação deste texto, a posição de Cármen Lúcia já havia sido seguida pelos ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e o vice-presidente do STF, Luiz Fux.
“O passado do Brasil condena em matéria de utilização indevida dos órgãos de segurança. Esse tipo de monitoramento para saber o que fazem eventuais adversários é completamente incompatível com a democracia. A menos que se tivesse qualquer elemento para supor que eles tramavam contra o Estado ou instituições democráticas. Mas se a preocupação fosse verdadeiramente essa, talvez fosse o caso de monitorar os grupos fascistas e não os antifascistas”, criticou o ministro Luís Roberto Barroso.
Na avaliação de Rosa Weber, relatórios de inteligência “não podem ter como alvo uma ideologia específica, ou sua ameaça, independentemente da ideologia que expressa”. “Em uma democracia, ninguém deve temer represálias por apenas expressar uma opinião, uma crença um pensamento não endossado por quem ocupa posição de autoridade. Um estado constitucional não admite que sejam as ações do estado orientadas pela lógica do pensamento ideológico”, frisou a ministra.
A pasta comandada pelo ministro André Mendonça fica proibida de levantar dados sobre a vida pessoal, escolhas pessoais ou políticas e práticas cívicas exercidas por opositores ao governo.
Para o ministro Edson Fachin, o direito à livre manifestação e o direito ao protesto, como o do movimento “antifascista” que teria ensejado o relatório questionado, não é infração penal e “não está, portanto, sujeita, seja à investigação penal, seja à atividade de inteligência”.
“A defesa da liberdade de expressão também é muito importante na atração dos investidores estrangeiros. Os reflexos internacionais, quando se insinua esses relatórios que podem voltar nossa memória a um período bastante nebuloso, tem reflexos internacionais”, afirmou Fux.
Planilhas
Em seu voto, Moraes destacou que o dossiê contra servidores antifascistas lista, Estado por Estado, a relação de policiais que seriam opositores do governo.
“Uma coisa é estabelecer, através de troca de informações, em tese, que há uma possibilidade de greve de policiais que possa gerar insegurança pública. Isso é importante nos relatórios de inteligência para se evitar o caos social. Uma coisa é a troca de informações, relatórios de inteligência para se verificar eventuais manifestações que possam interromper, como houve na greve dos caminhoneiros, o abastecimento. São fatos – você analisa fatos. Outra coisa é começar a planilhar, Estado por Estado, policiais militares, civis, que são lideranças eventualmente contra o governo, lideranças contra manifestações realizadas a favor do governo”, disse Moraes.
Ex-ministro da Justiça do governo Temer e ex-secretário de Estado do governo de São Paulo, Moraes disse que não importa se o policial militar, civil, rodoviário federal ou federal é “a favor politicamente A ou B, se vota em A, B, C, se professa determinada religião ou crença filosófica”. “Desde que ele exerça sua função dentro dos limites legais, tem absoluta liberdade para aderir. Não são os órgãos de inteligência do Estado que podem fiscalizar, intuir se ele é a favor ou contra (ao governo)”, observou o ministro.
Moraes apontou desvio de finalidade na “tentativa de determinados órgãos de inteligência” de planilhar as preferências políticas, filosóficas de agentes policiais, sem que eles tivessem cometido qualquer atividade ilícita. “Começa-se a se taxar pessoas, não é isso que a legislação autoriza. Não é possível que qualquer órgão público possa atuar fora dos limites da legalidade. Isso é grave. Tava mais pra fofocaiada do que pra relatório de segurança”, resumiu o ministro.