‘Meu olho foi retirado’, diz um dos atingidos pela PM; segunda vítima confirma que também perdeu visão

Por G1

Daniel da Silva foi atingido no olho por bala de borracha atirada pela PM durante protesto contra Bolsonaro no Recife, no sábado (29) — Foto: Hugo Muniz
Daniel da Silva foi atingido no olho por bala de borracha atirada pela PM durante protesto contra Bolsonaro no Recife, no sábado (29) — Foto: Hugo Muniz

“Meu olho foi retirado. Estou sem a visão. Na situação que a gente está, tem que agradecer a Deus, mas eu não desejo para ninguém”. O depoimento é do adesivador de táxis Daniel Campelo, de 51 anos, uma das vítimas da ação da PM durante o protesto pacífico contra Bolsonaro (sem partido), no Recife,no sábado (29). Nesta segunda (31), ele passou por uma cirurgia e teve o olho esquerdo removido.

A cirurgia de Daniel ocorreu na Fundação Altino Ventura (FAV), onde ele estava sendo acompanhado. A vítima, no entanto, está internada no Hospital da Restauração, em observação.

Daniel Campelo, de 51 anos, passou por cirurgia nesta segunda (31). Ele e Jonas de França foram atingidos por balas de borracha atiradas por policiais militares, durante manifestação contra Bolsonaro, no Recife.

No mesmo quarto, está o arrumador de contêineres Jonas Correia de França, de 29 anos, que também foi atingido no olho pelos policiais militares.

Jonas, nesta segunda, recebeu a confirmação dos médicos da FAV de que perdeu totalmente a visão do olho direito. Ele segue aguardando que o olho desinche, para, assim, ser novamente avaliado pelos médicos.

Na quarta-feira (2), ele deve ir até a fundação em jejum, já que, possivelmente, deverá passar por uma cirurgia.

'Quero que ele perca a farda', diz homem atingido no olho pela PM durante protesto
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Os dois trabalhadores sequer estavam no protesto e foram ao Centro da cidade para trabalhar, quando foram pegos de surpresa pela barricada dos policiais militares. Abalado, Daniel Campelo se limitou a confirmar que teve o olho removido. Ao lado dele, Jonas França falou sobre a indignação de ter sido vítima do estado.

“Só Deus sabe o que eu passei e estou passando. Hoje eu acordei muito triste, angustiado, porque sou um jovem novo, com saúde, independente, gosto de trabalhar. Sou muito de família, penso muito nos meus filhos, e o que vai ser de mim agora? Dos meus filhos e da minha esposa, que precisam de mim? Não sei nem o que falar, é só o desespero mesmo, de um pai que corre atrás do sustento da família. Já chorei muito”, afirmou o arrumador.

Jonas Correia de França foi atingido por balade borracha no olho pela PM, no Recife — Foto: Reprodução/WhatsApp
Jonas Correia de França foi atingido por balade borracha no olho pela PM, no Recife — Foto: Reprodução/WhatsApp

Por meio de nota, a Fundação Altino Ventura afirmou que Jonas Correia de França foi atendido na emergência da unidade hospitalar, no sábado, após ser encaminhado pelo Hospital da Restauração. Na primeira consulta, a vítima sofria com forte dor no olho direito e os médicos identificaram um edema periocular, além de sangramento intraocular.

Desde então, o paciente vem sendo acompanhado pela equipe da fundação, mas continua internado no HR, onde é medicado para que o inchaço diminua. O Hospital da Restauração afirmou, nesta segunda-feira, que ele foi liberado pelos médicos do hospital, mas seguem no local para observação.

“Lateja muito e está muito inchado. É como se a dor fosse para o cérebro. Dói muito, muito mesmo. Eu estava voltando do trabalho, liguei para minha esposa para dizer que ia demorar, por causa do protesto. Eu cheguei a falar com os policiais, falei que sou pai de família, cristão, e que não estava no protesto. Tinha até um saco de carne moída na minha bicicleta. Quando olhei para frente, um policial saiu de trás do outro e atirou”, disse.

A Fundação Altino Ventura afirmou, ainda, que desde o primeiro dia em que foi atendido, Jonas já tinha um “comprometimento importante da visão” e novos exames foram feitos nesta segunda-feira. O paciente deverá retornar ao local na quarta-feira (2).

Até o momento, “nenhuma cirurgia foi indicada para o caso, mas a conduta pode mudar a partir da evolução do paciente e dos resultados dos novos exames”, disse a nota enviada pela fundação. A outra vítima, Daniel Campelo, não autorizou a divulgação de boletins de saúde pela fundação.

PMs atiraram balas de borracha e gás lacrimogêneo contra participantes de protesto contra Bolsonaro no Recife — Foto: Agência JCMazella/Sintepe/Divulgação
PMs atiraram balas de borracha e gás lacrimogêneo contra participantes de protesto contra Bolsonaro no Recife — Foto: Agência JCMazella/Sintepe/Divulgação

Sentindo muitas dores, Jonas Correia de França afirmou que, até o momento, não foi procurado diretamente por nenhum membro do governo estadual, a quem a Polícia Militar é subordinada. A esposa dele, Daniela Barreto de Oliveira,participou de uma reunião com o secretário de Justiça e Direitos Humanos de Pernambuco, Pedro Eurico, nesta segunda (31).

“Ninguém se pronunciou nem para dizer ‘eu estou aqui, você tem minha solidariedade’. Mesmo que seja mentira. Eu quero que eles [os policiais] percam a farda, porque policial é para proteger cidadão, não para espancar. Hoje, meus dois filhos estão com saudade. Minha filha, que dormia comigo, está sem comer direito. Minha esposa só vive chorando. E agora, como vai ficar? Já chorei muito, só Deus sabe”, declarou Jonas.

Polícia truculenta

Vídeos mostram ação truculenta da PM durante protesto contra Bolsonaro no Recife

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A ação da PM durante o protesto no sábado (29) foi alvo de diversas críticas e repúdio por parte de políticos, partidos e diversas instituições. Os manifestantes relataram uma resposta desproporcional da corporação, que interveio no ato com balas de borracha, spray de pimenta e bombas de gás lacrimogêneo.

A vereadora do Recife Liana Cirne (PT) foiagredida com spray de pimenta por policiais militares. O comandante da operação e quatro policiais militares envolvidos na agressão à vereadora foram afastados, segundo o governo estadual.

O cantor Afroito foi arrastado e detido por policiais militares durante o protesto, sendo liberado após pagar fiança de R$ 350.

O advogado Roberto Rocha Leandro, que é presidente da Comissão de Direito Parlamentar da Ordem dos Advogados do Brasil em Pernambuco(OAB), foi agredido com duas balas de borracha na perna e duas nas costas disparadas pelos policiais militares.

Ainda no sábado (29), a vice-governadora de Pernambuco, Luciana Santos(PCdoB), afirmou que a dispersão do protesto não foi autorizada pelo governo do estado.

Na manhã desta segunda (31), o secretário Pedro Eurico repetiu que a ordem não partiu do governo, mas disse que não há uma Polícia Militar paralela em Pernambuco.

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