Esvaziamento do Conama embasa pedido de afastamento de Salles

Fonte: Noticia ao Minuto

O esvaziamento do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) fundamenta o pedido de afastamento do ministro Ricardo Salles que está parado há 85 dias na Justiça. A ação de improbidade foi apresentada pelo Ministério Público Federal em julho, sofreu um vai-e-vem judicial e ainda não foi julgada. Nesta segunda, 28, a Procuradoria cobrou ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) que avaliasse o afastamento de Salles em caráter liminar.

O Conama é presidido por Salles e, nesta segunda, 27, o colegiado aprovou quatro mudanças no regimento ambiental, sendo a principal delas a extinção de resolução que estipulava parâmetros, definições e limites de Áreas de Preservação Permanente (APP) no litoral e nas regiões de manguezais e restingas. A medida abre espaço para especulação imobiliária nas faixas de vegetação das praias e ocupação de áreas de mangues.

A decisão foi tomada por um colegiado que foi esvaziado por Salles em maio do ano passado, que por decreto reduziu o número de integrantes do Conama de 96 para 23.

A mudança, segundo a Procuradoria, resultou ‘num aumento proporcional da representatividade do governo e redução substancial da representatividade da sociedade civil (redução de mais de 80%)’. A alteração, por exemplo, cortou de 11 para quatro vagas destinadas a representantes de entidades ambientais, cujo mandatos também foram reduzidos de dois para um ano, sem possibilidade de recondução.

A Procuradoria cobrou ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) que avaliasse o afastamento de Salles em caráter liminar

Hoje, as votações do Conama são facilmente vencidas pelo governo porque dos 23 membros, apenas 21 votam e destes, oito são representados por ministérios da gestão Bolsonaro e por demais órgãos federais. As decisões são tomadas por maioria simples (11 votos).

“Como resultado dessas mudanças, o caráter democrático e participativo do Conama foi praticamente esvaziado, e houve o aniquilamento da razão de ser do órgão, que é a de congregar diversos setores da sociedade em um fórum encarregado para a elaboração de políticas ambientais”, afirmou o Ministério Público Federal.

“Ademais, foi estabelecida uma gritante disparidade na composição: os representantes dos múltiplos interesses parciais (notadamente os de natureza político-governamental, econômica, etc) passaram a deter a esmagadora maioria de assentos do colegiado, colocando-se em flagrante minoria os conselheiros que representavam estritamente o propósito de defesa e preservação ambiental”, continuou.

A Procuradoria apontou que Salles, ao alterar a composição do Conama, buscou ‘extirpar do colegiado a participação direta da sociedade civil’, de forma a impedir a possibilidade de ‘contenção e controle social do poder normativo’ do Conselho.

As alegações foram apresentadas no dia 06 de julho à Justiça Federal do Distrito Federal como parte de um conjunto de ‘atos, omissões e discursos’ que apontariam para uma ‘desestruturação dolosa’ da política ambiental brasileira sob o comando de Ricardo Salles. A ação está sem análise liminar há 85 dias – e já sofreu um vai-e-vem judicial ainda não esclarecido sobre quem deve avaliar o pedido do Ministério Público Federal.

O impasse começou após o juiz Márcio de França Moreira, da 8ª Vara Federal do Distrito Federal, remeter o caso para a 6ª Vara Federal de Florianópolis sob o argumento de que aquele juízo era o responsável por avaliar a ação contra Salles – um processo semelhante foi apresentado contra o ministro por lá.

Os autos, no entanto, voltaram para Brasília após o desembargador federal Ney Bello, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) cassar a decisão do juiz Márcio Moreira, deixando a cargo da Terceira Turma do tribunal decidir o destino final da ação. Não há, porém, prazo para isso acontecer.

Na semana passada, a Procuradoria pediu ao juiz Márcio Moreira que avaliasse em caráter liminar o pedido de afastamento de Salles, mas o magistrado disse que não tomaria a decisão antes da Terceira Turma do TRF-1 decidir quem deve julgar o processo. O MPF apresentou então um pedido ao tribunal, que aguarda resposta.

Além das alterações no Conama, a Procuradoria citou no pedido de afastamento de Salles a exoneração de dois servidores e um diretor de fiscalização do Ibama após ação contra garimpeiros que atuavam em terras indígenas em Altamira (PA).

Em depoimento, Renê Oliveira e Hugo Loss alegaram ter sofrido pressão do governo em operações de combate a crimes ambientais após o Fantástico exibir máquinas de garimpo sendo queimadas após fiscalização do Ibama. O chefe deles, Olivaldi Azevedo, foi chamado para conversa no Ministério do Meio Ambiente no dia seguinte à reportagem.

“O Olivaldi entrou em contato comigo para avisar que tinha sido chamado no Ministério e que, dependendo da situação, depois gostaria de falar comigo. Respondi que estava à disposição. Aí ele me ligou, por volta das 17h30 – 18h e pediu para nos encontrarmos”, relatou Oliveira. “Fomos lá no Ibama e recebi a informação dele assim, sem muitos detalhes: ‘a coisa ficou insustentável, estou saindo, fui exonerado, tive uma reunião agora no Ministério'”.

Salles classifica a ação do Ministério Público Federal como ‘tentativa de interferir em políticas públicas’. “A ação de um grupo de procuradores traz posições com evidente viés político-ideológico em clara tentativa de interferir em políticas públicas do Governo Federal”, afirmou. “As alegações são um apanhado de diversos outros processos já apreciados e negados pelo Poder Judiciário, uma vez que seus argumentos são improcedentes”.

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